Foi DEZ!

24 de dezembro de 2010

2010 começou com um fardo bastante grande: ser um ano ao menos comparável com o de 2009. Em 2009 fiz o intercâmbio, morei em Santiago de Compostela, conheci milhares de pessoas que vou levar para sempre no coração. Foi, no mínimo, um ano brilhante. Confesso que não esperava muito desse ano que agora está terminando, apesar de ele ter começado de forma maravilhosa


Já contei como ele começou?

Estava em Compostela com um grupo de uns 10 brasileiros. Tínhamos duas garrafas de champanha, 12 uvas pra cada um, uma calcinha roxa (que eu estava usando por baixo de muita roupa, no caso), o bucho cheio de escondidinho da ceia e muita pressa pra chegar na frente da catedral onde aconteceria a festa...bom, eu, pelo menos, estava com bastante pressa. No final das contas uma parte do grupo ficou esperando outra, outra parte se perdeu, alguns correram porque estava chovendo e, quando deu meia noite, estávamos só eu, o Tyler e uma das duas garrafas de champanha, na frente da catedral, emocionados com os fogos e ensopados por causa da chuva. Foi lindo! Eu falei isso pro Tyler na hora e repito agora. Melhor impossível!

 Fogos sobre a catedral de Santiago de Compostela

Eu gorda, o Tyler magro e os dois ensopados na virada de ano 2009/2010

 

Depois da virada do ano comecei a contar os dias para voltar pra casa. Adorei a Europa, mas tava morrendo de saudade da minha família, do Brasil, dos morros de Itatiba e dos travestis de Rio Preto. Foi nesse momento de contagem regressiva que, simplesmente, me apaixonei. Assim, do nada, por alguém que havia acabado de chegar lá no estrangeiro. Eu, Marina, o coração de pedra que gosta de todo mundo mas não se apaixona por ninguém. Eu me apaixonei de verdade. Como diria o Zagallo: “Aí sim...”

É ÓBVIO que eu voltei pra casa e tive que esperar seis meses pra investir nesse sentimento. Afinal, sou eu. O que realmente importa nesse caso é que voltei a acreditar no amor e, garanto, isso já seria o suficiente pra tornar o ano de 2010 um dos mais importantes da minha vida.

Aí vem a pergunta, essa pessoa foi a mais importante da minha vida nesse ano? Não. Mesmo que eu ainda estivesse namorando, não seria. É claro que foi muito importante, mas a mais importante, sem dúvida, foi o meu pai.

Quando eu tinha 9 anos participei de um concurso de poesia na escola e acabei ganhando o terceiro prêmio. O tema era “O Heroi dos meus Sonhos”. Não lembro de toda a poesia, mas lembro da estrofe final:


“Meu pai, o herói dos meus sonhos

Que dos meus sonhos risonhos vem

Protegendo toda a família

E as outras pessoas também”

Tá, não é lá muito complexo, mas posso dizer que “Heroi dos meus Sonhos” é o título perfeito para o meu pai, porque num dia muito especial desse ano ele olhou nos meus olhos e disse que eu teria o apoio dele para tudo o que eu decidisse fazer da minha vida, independentemente do que o resto do mundo pensasse. Uma atitude que me fez chorar feito louca, de alívio e felicidade. Resumindo bem: o bigodão é foda!

O heroi dos meus sonhos


Tendo o apoio dele, uma aceitação em andamento da minha mãe e a certeza de que não estava fazendo mal pra ninguém, ergui a cabeça, arregacei as mangas e fui a luta para concluir o último ano de faculdade com a consciência tranquila e 100% de aproveitamento.

Estou falando, é claro, do que realmente importa na faculdade. Os amigos, as bebedeiras, as festas. Pra ter 100% de aproveitamento nas disciplinas eu teria que começar tudo de novo e, não, brigada, eu prefiro qualidade de vida.

Se os outros anos tinham sido repletos de farra, esse último, sem dúvida, entrou pra história! Os treinos de futsal viraram reuniões de família: sempre repletos de xingamentos carinhosos e concluídos com uma boa e gelada cerveja no Chalé. Aliás, se fosse pra dizer qual foi meu lugar preferido de 2010 ficaria em dúvida entre o Chalé, o Portuga e o Vila Dionísio. Não pelos lugares em si...pelas companhias, sempre! Poderia citar vários nomes que fizeram a diferença nesse ano, mas como minha memória é uma merda e sempre esqueço alguém extremamente importante, prefiro apenas agradecer a todos vocês que, em maior ou menor proporção, transformaram esse ano num período tão especial!

TRADUTORES 2010

 Churrasco dos Formandos

Time de Futsal feminino - IBILCE 2010
 No final das contas, o ano que prometia ser a ressaca de 2009 está acabando de forma espetacular! Ganhei uma amiga-companheira-irmã que vai passar o natal comigo, concluí a faculdade com uma boa média, fiz amigos pra vida toda, estou com o emprego garantido para o ano que vem, já tenho onde morar em São Paulo e, quando achei que o ano já não reservava mais nenhuma surpresa, descobri o quão prazeroso pode ser limpar o ouvido com um cotonete...isso soou meio estranho, mas tentem, é ótimo!

Obrigada a todos que caminharam comigo e boa sorte a quem, como eu, começa agora a enfrentar o mundo de outra forma. Feliz Natal desde Clementina. Feliz Ano Novo desde Santa Fé do Sul! Que essa virada de ano seja tão maravilhosa quanto a do ano anterior! O guarda-chuva já está a postos, a champanha já está na mão e a calcinha nova já está comprada...mas, dessa vez, ela é amarela.



Ao vivo

16 de novembro de 2010

- E quando eu disser "três" pode abrir os olhos, não abra antes.
(Música tensa ao fundo, tambores rufando em sintonia com o descompassado coração)
- Um, dois eeee... TRÊS! ABRA OS OLHOS
(Música alegre ao fundo, cheia de acordes maiores, sons de sininhos, close na cara de tacho do dono da casa)
- [...]
- E aí, o que achou?
- Eu...
- Não diga agora! Repare bem em cada detalhe, olhe com atenção! O que achou?
- Ah...eu...
- NÃO DIGA AGORA! Olhe para a nova textura da parede, para o novo piso, os novos moveis, a sua nova casa. E então, o que achou?
- [...]
- Está sem palavras?
- Não, só estava me perguntando se você ia me deixar falar.
- Ah, claro, sinta-se em casa. Hahaha. Pegou? Pegou? Sinta-se em casa na SUA casa! Hahaha! Olhe para aquela câmera e diga com toda a sinceridade, o que achou da reforma maravilhosa que fizemos?
- Eu... eu acho que vou vomitar.
- Que Maravilha!! Ele disse que...peraí, o que você disse?
- Eu disse que vou vomitar. Isso está horrível!
- Como assim, horrível?
- Olha a cor da parede!
- Não gostou da cor da parede?
- É verde-catarro! Quem diabos pintaria uma parede de verde-catarro e teria a cara de pau de me perguntar se gostei?
- Bom, mas olha o sofá que luxo!
- Ele é laranja.
- Sim, moderno, bonito...
- Se tem uma cor que detesto mais que verde-catarro é laranja. As duas cores combinadas então...e, meu Deus, o que é isso?
- É uma poltrona. Ela é superconfortável e...
- Florida.
- Sim, florida, sua noiva vai adorar.
- Terminei meu noivado ontem.
- Ah, sinto muito.
- Ela não gostava nem de ganhar flores, imagina se ia gostar de uma poltrona florida!
- Bem, ótima oportunidade para procurar uma nova noiva, não? Uma que goste de flores...
- (choro)
- Querido, por que está chorando?
- Minha casa, vocês destruiram a minha casa! Cadê a minha TV?
- Ela está ali, sobre aquele móvel lindíssi...
- Eu gosto da minha TV do lado da lareira! Gosto de olhar pra TV e ver o reflexo do fogo, não quero minha TV sobre aquela mesa horrorosa que vocês colocaram ali, quero MINHA TV do lado do MEU fogo! (choro desesperado)
- Calma, você não gostou das mudanças que fizemos?
- (Choro) Nãããooo...
- Se trocarmos a cor da parede você vai ficar feliz?
- (Soluços) ...nãããooo...
- Ok, existe alguma outra mudança que a gente possa fazer que vai te deixar feliz?
- Além de sumir com o verde-catarro?
- Isso.
- E com esse sofá laranja?
- Isso.
- Quero minha casa como era antes!!!
- Isso é impossível, meu querido, sinto muito.
- Sente muito? SENTE MUITO? Não consigo nem olhar pra essa coisa horrorosa que vocês fizeram, pelamordedeus, como alguém pode se formar em Design e destruir a casa de um cidadão honesto que não faz mal a uma mosca?
- É a universidade brasileira, o MEC aprovando tudo que é curso em qualquer faculdade, aliás, uma faculdade mais vagabunda do que a outra, sabe como é...Não que esse seja o caso do nosso designer, imagina, ele é ótimo, aqui só tivemos um...choque de gostos.
- Choque de gostos? Você tem a pachorra de dizer que o problema aqui é só de mau gosto? Eu vou pegar esse microfone e enfiar no seu...
- Tive uma ideia!
- Ideia?
- Sim! Infelizmente não temos como alterar a reforma da casa, mas nossa emissora tem um outro programa que será perfeito pra você que agora está solteiro. Você será trancafiado em uma casa cheia de câmeras com 10 mulheres e um anão. Ficarão lá dentro se conhecendo, fazendo amizade, curtindo festinhas, nadando, se divertindo e sendo vigiados por todo o país. O que acha? No final das contas pode dar casamento...com uma das 10 mulheres ou com o anão, as opções são variadas!
- Bom...
- Oportunidade única, rapaz, outros matariam para ter essa chance.
- Acho que pode ser uma boa ideia...
- Boa? É ótima! Você ficará famoso...talvez não por muito tempo, mas tempo o suficiente pra ganhar um dinheirinho posando para a G Magazine...
- Só tenho uma pergunta a fazer.
- Pois não?
- Essa casa, cheia de câmeras...
- Sim?
- Tem paredes verde-catarro?

Fim

27 de outubro de 2010

Nada.
Foi o que senti ao te olhar entrando pela porta.
De Nada.
Era a minha vontade diante de suas perguntas sobre o meu dia.
Absolutamente Nada.
Foi o que vi nos seus olhos quando disse que não queria mais esperar nada de você.
Assim como nada senti quando você me abraçou, nem vontade de sorrir, nem de chorar, nem mesmo de abraçar, nem nada.
Com os olhos mareados te vi ir embora e cruzar a rua. Microminimalíssima prova de que havia um coração aqui dentro. Rascunho de lágrimas que desapareceu com você na esquina e deu lugar a...nada.
Nadessíssima de nada.
Nada além do vazio deixado pelo Tudo que você tinha sido.

Inspirado num sentimento que vem Do fundo do mar e da alma

Adulta

18 de outubro de 2010

   Foi assim, de repente, esperando bagunça, uma casa destruída, cerveja saindo pelas torneiras, churrasco só com o cheiro da carne, música brega, pessoas bêbadas correndo por todos os lados, beijos e abraços em desconhecidos, que percebi como as coisas estavam diferentes.

   Foi quando entrei naquela casa linda e me ofereceram carne, cerveja, vinho – seco – ou suco, vinagrete e mandioca cozida, quando vi crianças correndo pelo quintal e pessoas mais velhas conversando e rindo moderadamente, foi quando te vi com um chapeuzinho de festa na frente do bolo de aniversário que percebi, minha amiga, que algo havia mudado.

   Você estava mais linda do que nunca, com o sorriso incrível de todos os dias, o carinho absurdo de anos e a amizade que sempre tivemos...mas estava diferente.

Foi assim, num momento de surpresa, em uma noite de festa, que percebi que você havia crescido.

   Era como se tivesse perdido uma pessoa que amava muito e estivesse conhecendo outra, que amava também antes mesmo de conhecer.

Adulta, como dizem...adulta.

   E eu me senti pequena vendo sua felicidade. E me senti grande por ter sido convidada pra estar ali. E me senti criança perto de você. E senti orgulho de estar ao seu lado.

   E me lembrei dos nossos planos “Peter Pan”, das nossas preocupações com prova, da dificuldade de juntar dinheiro pra viajar com os amigos, dos sonhos tão bonitos, tão distantes, tão infantis, e percebi que ainda sonhava os mesmos sonhos enquanto você já realizava os seus.

   Olhando pra você com uma criança no colo e a família do lado só me restou sorrir, e enquanto todos a parabenizavam pelo aniversário, eu a parabenizava pelo crescimento.

Que "Littlemarininha" que nada! Que moleca que nada!
Quando crescer quero ser como você.

Uma história de ficção

7 de outubro de 2010

Vou contar uma história totalmente fictícia e improvável que não sai da minha cabeça.
Um dia, a Moça vai se despedir do amigo que está indo embora e acaba conhecendo um outro cara que vai ocupar o quarto vago. Um cara que não fala português, que veio de algum país frio...vamos chamar esse país fictício de Alemanha.
Ela tenta ser legal, diz que ele pode chamar caso precise, numa boa, sem rodeios.
Ele chama...às duas horas daquela madrugada.
Ela atende e, pacientemente, aguenta as cantadas, as tentativas de abraço, mesmo se sentindo ridícula. Tenta colocá-lo pra fora milhares de vezes, milhares, até que, simplesmente, abre a porta e diz algo educado como: "Get out now, I really need to sleep".
No dia seguinte, a mesma coisa.
Ela, de saco cheio, avisa as meninas que moram com ela sobre o cara, porque, nessa situação hipotética, a Moça mora com mais duas meninas.
As duas também são cantadas pelo alemão, até que decidem parar de atender a porta. Ninguém atende a porta, ninguém sai na sacada, ninguém deixa as janelas abertas para que ele não perceba que tem gente em casa, saem para a rua torcendo para não encontrá-lo nas escadas.
Até que um dia, esse alemão manda uma mensagem para a Moça num site de relacionamentos que aqui, por falta de nome mais apropriado, chamarei de facebook.
Nessa mensagem, ele diz ouvir uma "conversa" íntima da Moça com a respectiva namorada, e oferece ajuda, caso as duas precisem.
Ele sabe da namorada porque, tentando evitar uma aproximação, a Moça disse a ele no primeiro encontro que era comprometida com uma outra moça, enfim. Tudo ficção.
Após ler essa mensagem, a Moça perde o controle, manda o cara a merda em 15 idiomas e acredita que, dali para frente, ele vai entender como as coisas funcionam.

Tudo segue na santa paz por um mês, até que, numa noite, uma das meninas que mora com a Moça abre a porta sem ver quem batia e dá de cara com o alemão:
"Oi...a Moça...estar?"
"Não, a Moça não está."
"Eu precisar lavar minha roupa, se lavar à mão, não secar until sábado. Possow lavar aqui?"
A amiga, embasbacada, diz que não, que a Moça não estar, que ela estar para sair e que ele estar para dar o fora.
Cinco minutos depois essa amiga sai de casa. A Moça, lembrando-se de algo importante, sai na janela e grita esse algo importante para a amiga, que a essas horas, nessa situação hipotética, já estava na garagem.
Ela responde com uma voz estranha.
O que a Moça não sabia é que, quando gritou, sua amiga estava de frente para o alemão, que, na garagem, esperava por ela.
"A Moça não estar, right? Mentirosa!"
Dali em diante a porta voltou a ficar trancada, as janelas voltaram a ficar fechadas e ninguém mais saiu na varanda. Surgiu um medo estranho de aquele cara, de repente, aparecer com uma arma dando tiros a torto e a direita...pessoas estranhas sempre fazem coisas estranhas
É óbvio que tudo isso que contei não aconteceu, que pessoas que vêm de países frios não são tão intrusivas, jamais, mas, imagina se tivesse acontecido...
Acho que ninguém acreditaria.

Sensibilidade

23 de agosto de 2010

Ficaram trancados no quarto durante todo o final de semana, dois dias e duas noites inteiras. Saíam apenas pra comer e ir ao banheiro, depois voltavam e recomeçavam a brincadeira dos corpos, dos toques.
No domingo a noite, exaustos, resolveram que era hora de relaxar, descansar, acariciar as mãos em vez das nádegas, os cabelos em vez dos seios.
Nesse momento lindo ela sentiu algo forte e não se conteve:
"Eu te amo."

"..."

"Você ouviu? Eu disse que te amo."

"Ah...brigado."

"Brigado? Eu acabei de dizer que te amo e é só isso que você tem pra me dizer? Brigado?"

"...MUITO obrigado?"


Nunca mais se falaram.

Sono pesado

16 de agosto de 2010

Acordei depois de uma noite sem dormir, sentei na beirada da cama, procurei meus chinelos por todos os lados, e quando vi que eles voavam pelo teto percebi que estava sonhando. Acordei com a sensação de que a noite havia passado em quinze minutos, levantei na manhã morna, tomei um banho gelado, e fiz um estrago tentando agarrar a xícara de café quente que caiu da pia quando esbarrei pra pegar um bolinho. Senti minha mão queimar com o café e acordei na cama, deitado sobre a mão que na verdade formigava. Olhei no relógio e estava atrasado para o trabalho. Saí correndo feito louco, tropeçando na cama, na porta, no cachorro. Peguei o ônibus vazio, sentei e fechei os olhos, foi quando percebi que nenhum ônibus naquele horário estaria normalmente vazio e que eu não tinha cachorro para tropeçar. Acordei assustado com o toque do celular. Era meu chefe que estava ligando para me demitir por ter faltado três dias seguidos na firma. Comecei a chorar feito criança e ouvi ele me dizer que era para parar de ser maricas e seguir a minha vida. Dei um grito de desespero. Acordei novamente com o celular. Sentei na cama, me belisquei algumas vezes pra tentar acordar e não aconteceu nada. Atendi o celular e era meu chefe, dizendo que eu ia ser promovido pelo meu trabalho das últimas duas semanas. Achei que aquilo também já era demais. Mandei meu chefe a merda e desliguei o telefone.
Esperei.
Continuei esperando.
Dei um grito alto e forte que fez meu vizinho do apartamento de baixo pegar uma vassoura e bater no próprio teto para que eu parasse. Fui até a sala e não havia cachorro. Olhei pela janela e o movimento da rua era caótico. Me belisquei feito um doido e nada aconteceu.
Liguei para o meu chefe e ele não atendeu.
Liguei cinco vezes. Nada.
Sentei na cama. Nada.
Deitei na cama. Nada.
Fechei os olhos com bastante força pra tentar acordar de verdade. Nada.
Foi quando entendi porque minha mãe dizia que dormir de barriga cheia podia fazer mal.

Cadência

8 de agosto de 2010

Estava ofegante, as mãos suavam e o coração não batia, espancava. As pessoas em volta, ao contrário das ideias de sua cabeça, andavam em câmera lenta, falavam em câmera lenta.
Nada do que diziam era interessante, a não ser quando falavam dela. Ela que tinha ficado longe por tanto tempo e agora estava de volta.
Todos haviam se encontrado com Ela, menos a pessoa de mãos suadas e olhos atentos que tentava, a todo custo, se distrair com qualquer coisa que não fosse Ela.
Foi quando aconteceu.
Num segundo que pareceu uma hora, se encontraram, se olharam, sorriram, correram e se abraçaram, num abraço de uma hora que pareceu de um segundo.
A felicidade era tão grande que acelerou ainda mais o coração, e quando achou que ia ter um ataque cardíaco por finalmente estar com Ela, percebeu que estava tendo era um ataque de riso, daqueles que se espalham e contagiam o mundo.
Caminharam de braços dados, com passos cadenciados, para pouco depois cadenciarem também o riso, a respiração, o coração, os movimentos. Seguiam, outra vez de mãos dadas, na mesma direção.

Pra sempre

1 de agosto de 2010

Ele não era bonito, nunca tinha sido bonito, isto estava na cara. Era sim muito divertido, extremamente inteligente e bem mais velho, o que o tornava insuportavelmente atraente.

Ela também não era bonita. Era de natureza extrovertida, e, apesar de ter vivido muito para a idade, achava, como toda adolescente, que sabia de tudo no auge de seus 16 anos.

Ele tinha namorada. Ela sempre soube. O que tornava a relação professor-aluna apenas mais um detalhe picante da relação proibida.

Em meio a conversas sobre física, química e pedagogia, começaram a surgir discussões sobre namoro, relacionamentos e sexo. O horário de aula passou a ser o momento mais esperado do dia. As salas sem câmera da escola eram os esconderijos perfeitos. Os olhares trocados nos corredores, os toques discretos em momentos oportunos, as palavras sussurradas no ouvido em meio ao barulho da multidão de alunos na hora do intervalo e o jogo sempre limpo entre os dois, sem promessas ou mentiras, culminaram numa relação verdadeira, intensa e parcialmente escondida.
Parcialmente porque as pessoas em volta sabiam que acontecia alguma coisa entre os dois. Fato é que ninguém nunca soube o que realmente acontecia.

Não era só amor. Não era só paixão. Não era só amizade. Não era só sexo. Não era abuso. Não era.

Era adoração. Tesão. Confiança. Amizade coloridíssima. Pegada. Carinho. Respeito mútuo. Era algo que esfriaria com a distância mas que não acabaria nunca. Que ficaria guardado dentro dos dois e que voltaria à tona numa rápida troca de olhares, mesmo anos depois.

Ele talvez desistisse da namorada se ela pedisse. Ela certamente desistiria de muita coisa se ele pedisse. Mas isso nem sequer passaria pela cabeça dos dois. “Pedir” não fazia parte do acordo selado sem palavras ou assinaturas, apenas com olhares.
Quando estavam juntos, um encontrava o mundo dentro do outro, e esse mundo bastava.

Somente esse mundo poderia explicar o nome dela naquele testamento.

Quando ele faleceu, 20 anos após o primeiro beijo dos dois, deixou para ela um bom dinheiro e uma carta. A namorada, que já havia se tornado esposa e agora era viúva, lhe entregou tudo em mãos, comentando algo como: "nem sei quem você é, mas seu nome aparecia antes do meu no testamento".
Levou o pacote pra casa e abriu quando o marido dormia. Junto do dinheiro encontrou a única foto que os dois haviam tirado, muitos anos antes, e um recado simples que resumia de forma brilhante um sentimento tão diferente de todos os outros:
"Um dia você me disse que queria conhecer a Europa. O dinheiro é pra essa viagem que sempre quis te dar, mas nunca tive como. Só me arrependo de não ir com você. Só mesmo! Se tivesse outra vida, faria tudo exatamente como fiz, pra não correr o risco de perder o seu sorriso. Para a melhor aluna que tive, que por preguiça aprendeu pouco de física, menos ainda de química, mas tudo de amor. Aprendeu tanto que ensinou o mundo e me encheu de orgulho e conhecimento. Amo você.
A.L."
Foi a primeira e última vez que ele disse que a amava. A impressão que ficou pra ela, no entanto, é que isso tinha sido repetido milhares de vezes naqueles anos.
Deitou na cama, abraçou a carta e, sorrindo, disse para si mesma, "Boa noite, professor, até amanhã". Fechou os olhos e dormiu pra sempre.

Fora!

6 de julho de 2010

Digas o que quiser
Estou Fora!
Muito mais do que os dias
que passam sem demora,
Eu só queria, por segundos,
Teus sorrisos de outrora.

Cartas, mensagens
Esses detalhes que ignoras
São meu jeito de te pedir carinho
De dizer que meu peito chora.
De buscar momentos felizes
Para endireitar nossa história.

Se minha presença não basta
E teus olhos se perdem lá fora
Não me peças pra ser menos criança
E me contentar com as antigas memórias
Foi pela criança que te apaixonastes
Não ouses agora mandá-la embora.

Digas o que quiser
Estou Fora!
Muito mais do que os dias
que passam sem demora,
Quero anos inteiros felizes
Rindo da tristeza de agora.

Engraçadinha

8 de junho de 2010

- ...Blablablablablablablablablablablablabla
blablablablablablablablablablablablablabla
blablablablablablablablablablablablablabla
blablablablablablablablablablablablablabla
blablablablablablablablablablablablablabla
blablablablablablablablablablablablablabla
blablablablablablablablablablablablablabla
blablablablablablablablablablablablablabla
blablablablablablablablablablablablablabla
blabla do Apocalipse. O que acha, Cristina?
- Oi?
- O que você acha?
- Ah...desculpa professora, poderia repetir a pergunta completa? Não ouvi direito.
- O que você acha da teoria de Nostradamus sobre o Apocalipse?
- Acho o fim do mundo!
Deu uma risadinha enquanto o resto da sala gargalhava, pegou a mochila e foi embora, deixando a professora com um giz na mão, o olhar perdido e a dúvida se daria a ela um 10 pela criatividade ou um 0, pelo mesmo motivo.

"... Mas vou até o fim"

31 de maio de 2010

Acordou num hospital sabendo que podia definir de várias formas, mas que só sendo bem direta explicaria a agústia que sentia naquele momento: a vida dela era uma merda.
Nasceu feia, careca e banguela como todos os outros bebês, mas sujava mais fraldas do que os outros, como sua mãe insistia em relembrar trinta e cinco anos depois.
Na escola não se dava bem com matemática, física, biologia, química, português...não se dava bem com nada, na verdade, e não por falta de arroz e feijão como sugeriu uma das professoras do primário.
Com muito esforço terminou a escola. Queria estudar arquitetura.
Não passou.
Prestou Design.
Não passou.
Artes.
Não passou.
Então decidiu prestar algum concurso público, mas também não passou.
Foi trabalhar na empresa do pai. Ela não queria ser fabricante de fraldas geriátricas, mas o salário compensava.
Sempre gostou de esportes. Era gandula de futsal, muito baixinha pra vôlei e basquete, muito gordinha pra correr maratona. Torcia pelo Rubinho na Fórmula 1. Para o futebol carioca no campeonato brasileiro.
Os dois namorados que teve na vida a trocaram por sua prima e sua mãe, respectivamente. O que, claro, causou o fim do casamento dos pais e o fim do namoro, ao mesmo tempo.
Começou a beber pra afogar as mágoas e em dois meses desenvolveu uma úlcera digna de cirurgia.
Teve de vender o Chevette pra pagar a cirurgia.
Sofreu na recuperação.
Voltando do hospital o ônibus onde ela estava bateu num poste no canteiro central de uma avenida movimentada. Ninguém se machucou.
Só ela, que quebrou a perna.
De saco cheio foi pra casa, pegou o revólver que o pai escondia numa gaveta pra caso a ex-mulher resolvesse aparecer de novo, carregou, apontou pra cabeça e atirou...
Acordou num hospital sabendo que podia definir de várias formas, mas que só sendo bem direta explicaria a agústia que sentia naquele momento:
A vida dela era realmente uma merda.

Biografando

14 de maio de 2010

Ribeirão Preto, 15 de setembro de 2002

Linda,

Ao contrário do que possa parecer, essa não é mais uma carta de amor...não só. Há muito ensaio escrever essas palavras, há muito planejo essa carta e, quando você receber, tenha certeza de que muito tempo terá se passado desde que ela foi escrita. Neste papel vou falar sobre mim. E não é egoísmo, quero apenas que você entenda a sua importância na vida deste pobre viajante.
Beijei pela primeira vez com 10 anos. Era uma criança. Não sabia o que estava fazendo mas queria mostrar que já era grandinho. Foi um beijo cronometrado por um dos outros dois casais que também estavam "se beijando". Uma piada, claro, mas a primeira pontada de puberdade mesclada à curiosidade sempre tão presente no meu dia-a-dia.
Disse que estava namorando pela primeira vez com 14 anos. Era só um rolinho mais sério, eu gostava era de outra pessoa. Fui namorar de verdade com 16. Durou pouco mais de um ano e foi lindo...mas não acabou muito bem. Erro meu, confesso, o tipo de erro que não cometo mais.
Virgindade? Apesar de ser tão precoce com o meu primeiro beijo não perdi a virgindade tão cedo não. Idade nesse caso é bobagem, o que vale dizer é que valeu muito a pena.
Namoro? Voltei a namorar depois de entrar na faculdade. Um namoro com altos e baixos, muito mais baixos que altos, o que é uma pena.
Em todos esses anos de vida, muitos, você sabe, só havia me apaixonado uma vez. Na época eu era adolescente e, depois, passei a achar que só tinha me sentido daquele jeito porque era criança demais pra saber até onde era saudável me entregar a outra pessoa.
Levei a vida muito bem nesses anos sem paixões, gostando muito de muitas pessoas mas desgostando tão rápido quanto havia gostado.
Foi nessa bagunça de conhecer novas pessoas e culturas que você apareceu e fez uma baderna na minha cabeça. Bom seria se fosse só na cabeça. Meu coração fica apertado quando lembro de você, do seu sorriso, do seu cabelo, tão comprido, tão liso, tão lindo. Fecho os olhos e chego a sentir sua presença do meu lado. O que chega a ser engraçado, porque isso tem gerado algumas dificuldades na hora de dormir. Então fico pensando em você, lembrando da gente e durmo querendo sonhar contigo e sonhando as vezes, e aí acordo feliz, radiante.
Por que estou falando de mim? Pra falar de você! Você que se tornou tão importante, tão essencial em tão pouco tempo.
Obrigado por ter me transformado num cara melhor. Mais que tudo, você me provou que a criança inocente que se entrega sem medidas está sim muito viva dentro de mim. Meu coração tem pulado amarelinha, corda, cela. Cada dia está mais alegre, mais vivo.

Eu te amo! Desse crianção que sabe que também te perturba o sono,
Heitor

Atitude

30 de abril de 2010

Pisou na escola pela primeira vez ao 33 anos. Muda, filha de boias-frias que se mudaram para São Paulo em busca de uma vida melhor, nunca havia tido a oportunidade de estudar, nem o incentivo, de maneira que também não sentia a necessidade de conhecer as letras, as palavras. Os números conhecia, havia lidado com eles a vida toda: tantos alqueires de terra, a hora do almoço, os centavos de cruzeiro no fim de cada dia.
Aos 23 anos, cansada daquela vida, subiu na boleia de um caminhão e deixou os pais. Acabou por se casar com o caminhoneiro um ano depois.
Se comunicavam como era possível, quase sempre com olhares e sinais, mas, após alguns anos, como acontece com a maioria dos casais, a comunicação foi ficando difícil. Foi quando decidiu entrar pra escola. Colocou na cabeça que, se soubesse escrever teria a chance de dizer o que precisava para salvar o casamento.
Foram dois anos de muito esforço, aprendendo as letras, as estruturas da língua.
Um dia, sentindo-se preparada para bater de frente com o marido caso fosse necessário, pegou um papel e escreveu com letras infantis: "Você não mora sozinho. Abaixe a merda do assento da privada, não jogue as cuecas no chão e me procure na cama. Sou muda, não cega ou frígida."
Foram felizes para sempre.

Sobre o dia em que o mundo acabou

19 de abril de 2010

Dirigia tranquilamente na Marginal Tie...não, peraí, vamos deixar esse texto mais verídico.
Estava há horas parado tranquilamente no familiar congestionamento das seis horas da tarde na Marginal Tietê, vidros fechados, blindados, retrovisor direito virado para dentro pra evitar que fosse arrancado pelos motoqueiros, como tinha acontecido com o esquerdo, quando gritos mais altos do que as buzinas o tiraram do transe gerado pela música que tocava no rádio. Olhou pra frente e viu as pessoas saindo do carro, olhando pra cima e correndo pra todas as direções.
Primeiro achou que fosse um arrastão, mas então viu que ninguém tentava roubar os carros que estavam sendo abandonados.
Abriu a porta, olhou pra cima e quase caiu duro pra trás.
O céu estava cor-de-rosa, bem diferente da típica e natural cor vermelha do céu noturno paulistano.
Um raio azul, seguido de um trovão ensurdecedor, cortou o céu, dando início a uma chuva incessante, não de água ou de fogo, como descrito no Apocalipse, mas de canivetes.
Era, de fato, o fim do mundo.
Entrou de novo no carro, em partes por não saber o que fazer, em partes para fugir dos canivetes.
O grande momento, tão profetizado, havia chegado. E ele estava ali, no trânsito. Não sabia quanto tempo de vida ainda tinha e decidiu pensar no que fazer naquele momento tão decisivo.
Pegou o celular pra ligar para esposa, para a sogra, para o cunhado. Percebeu que não queria falar com ninguém naquele momento. E nem que quisesse, não havia sinal pra ligar pra ninguém.
Ele podia sair correndo, dando risada como um louco e fugindo como desse dos canivetes, que agora caiam com tanta força que começavam a perfurar a lataria do carro.
Podia procurar uma igreja, havia tantas, com certeza encontraria alguma ali perto. Mas ele nunca tinha sido religioso e, colocando-se no lugar de Deus, se ele existisse mesmo, não daria bola pra um sujeito que só acreditava nele na última hora.
Pensou em pular no rio Tietê, dar uma nadadinha, improvisar um borboleta, como fazia quando era garoto pra impressionar as meninas, mas percebeu que aquilo seria mais mortal do que ficar deitado no chão com a chuva de canivetes.
Podia também fechar os olhos e esperar. O que, convenhamos, não teria a menor graça.
A cabeça estava a mil e demorou um tempo pra que ele percebesse que a chuva de canivetes havia parado. Olhou para o céu e viu que estava negro e cheio de estrelas, saiu do carro louco de felicidade, subiu no capô e gritou pra comemorar a vida. A partir daquele momento ele ia cuidar melhor da família se a família ainda existisse, ia diminuir o ritmo de trabalho, beber menos, parar de fumar, ia até fazer exercícios e trocar o açúcar por adoçante, isso ele prometia, prometia com uma fé que nunca havia tido, pra Deus, pra esposa que talvez estivesse viva, pra ele mesmo, prometia até para os canivetes.
Foi nesse auge de extrema alegria que “PUF”
O mundo explodiu.

"Você me abre seus braços e a gente faz um país"

11 de abril de 2010

Cinquenta e quatro dias, foi o tempo que demorou pra que a ficha caísse.
Não chorei no avião voltando pra casa,
não chorei quando vi minha família,
não chorei quando voltei pra Rio Preto e tive um tempo sozinha pra pensar,
não chorei quando fui pra faculdade,
não chorei contando as histórias de Santiago, repetidas vezes, pra milhares de pessoas.
Não chorei nem olhando as fotos.

Chorei hoje.

Hoje, quando pessoas que conheci lá, e que vieram conhecer a cidade, foram embora.
Hoje, quando meu amigo italiano me abraçou e disse "Hasta pronto", e senti pela primeira vez que provavelmente o "pronto" não será tão "pronto" assim...talvez nunca exista. E, se existir, existirá mais uma vez, ou duas.

Ele me abraçou, entrou no carro. Eu virei de costas e fui andando. Pra minha casa. Não olhei pra trás, não acenei, e senti um nó na garganta que nem meu último dia em Santiago me deu.
Meu amigo é a representação de tudo o que eu vivi e não vivo mais.
É a representação dos melhores meses da minha vida.
É a representação da fugacidade do tempo e da minha mania besta de olhar pras pessoas como se fosse a última vez.
Talvez, dessa vez, seja mesmo.

Crescendo

30 de março de 2010

"Você não é de nada, só come marmelada! Você não é de nada, só come marmelada!"
As vozes, em coro, provocavam. Maldosas vozes vibrantes, que reverberavam na mente tristonha do menino mais novo do bairro.
O desafio era difícil. Enfrentar de face aberta a feia face do medo. Fugir dos frios olhos fixos a sua frente.
Só tinha dois jeitos de acabar com as provocações.
Fugir
ou
Pular.
Fugir ele não ia. Tinha já seus seis anos e seria covardia simplesmente se virar e sair correndo sozinho.
Ele sempre era considerado café-com-leite, por ser o mais novo, e agora, diante de toda a turma do bairro, inclusive do irmão mais velho, tinha de provar que já era homem, e não um saco de batatas.
- Ok, eu pulo.
"Ohhh, vamos ver ele pulando então, Paulinho, agacha"
De sacanagem colocaram o menino mais alto do bairro pra ser a "cela". O menino era tão alto que de brincadeira era chamado de Paulinho Não tinha mais jeito ele ia ter que pular se afastou pra ganhar uma boa distância fechou os olhos pediu emprestadas as asas do anjinho da guarda de quem a mamãe sempre falava esqueceu a gritaria dos outros meninos respirou fundo pegou carona no ventosaiucorrendodeuumgritoe...

Voou

El echar de menos

15 de março de 2010

Começou como brincadeira.
Ele com o jeito engraçado e descontraído de sempre jogou cantadas pra ela, como jogava para todas, e ela, ao contrário do que ele esperava, gostou.
Na primeira vez que saíram juntos foram a um sex shop, "só pra dar risada mesmo", como sempre se diz.
Saíram algumas noites pra beber com todo mundo. Três ou quatro vezes.
A partir da segunda vez o "sair com todo mundo" era só uma desculpa, os dois só trocavam olhares entre si e o fato de outras pessoas estarem presentes era mera formalidade.
Sentindo uma atração incontrolável ele tentou ficar com ela.
Não conseguiu...não totalmente.
Algo nela, talvez a vontade estampada nos olhos indo de encontro à boca que dizia que não queria nada, tornava tudo ainda mais incontrolável pra ele.
Depois de muito insistir, muito investir, muito implorar, muito querer, ele conseguiu roubar um beijo que foi retribuído, mesmo que por poucos segundos.
O beijo fez o pescoço dele arrepiar, o coração bater mais forte, o tempo parar e todas essas coisas bonitinhas que dizem que acontece quando se está apaixonado. Se bobear, até sininhos ele ouviu.
Não foram muito além desse beijo, mas o vazio que ele sentiu no dia que foi embora mostrou que nem era necessário muito mais do que isso.
Os dois não estão juntos por mil motivos que não vêm ao caso, mas ele, ao sentir-se vazio com a ausência dela sentiu-se também completo. Tinha outra vez um motivo pra acreditar que podia ser realmente feliz com alguém:
A felicidade extrema que experimentou quando menos esperava, por menos tempo do que queria, com uma intensidade maior do que a permitida.

"Eu ando pelo mundo prestando atenção em cores que eu não sei o nome..."

18 de janeiro de 2010

O mundo é mesmo uma coisinha engraçada.
Sai do calor da minha casa, há alguns meses, para descobrir que posso sentir calor quando os termômetros apitam 5ºC, e ainda comentar com o vizinho ao lado "nossa, que bom que deu uma esquentada, né? Hoje tô só com duas calças!"
Descobri que na França não tem pão francês, que em Nápoles não tem sorvete napolitano, que Santiago de Compostela não fica na Espanha, que os portugueses não tomam café da manhã, mas comem o "pequeno almoço", que é possível fazer grandes amigos passando uma noite num hostal, que sim, quem tem boca vai a Roma, que os italianos realmente falam com as mãos, realmente comem macarrão todos os dias, que tomam "caipiriña" e que eu adoraria falar italiano.
Provei o chá inglês na Itália, o café da manhã americano na Inglaterra, a pasta italiana na Espanha e fiz espanhola na...
Haha, mentira, não fiz espanhola. Os fatores físicos que me impediam de fazer isso ainda impedem. Não volto assim tão mudada pro Brasil.
Mas volto diferente.
Mais gordinha, mais trabalhadora, mais festeira, com um bom senso de localização (o que é ótimo, pra quem não tinha nenhum), sabendo andar de metrô, de trem, de avião, dando mais valor às coisas pras quais já dava muito valor e dando um pouco de valor às coisas pras quais não dava nenhum.
Mas, como prometi para o meu irmão, o olhar ainda é o mesmo.
Os olhos não, já viram muitas coisas e voltam um pouco mais míopes. Mas o olhar tranquilo e o sorriso são os mesmos.
Com a belíssima diferença de que agora estão muito, incrivelmente, infinitamente
mais frequentes.